Psicanálise e religião: efeitos da doutrinação evangélica na moral sexual contemporânea

Psicoanálisis e religión: efectos del adoctrinamiento evangélico en la moralidad sexual contemporânea
Psychoanalysis and religion: effects of evangelical indoctrination on contemporary sexual morality

CAROLINA CANCELA

Mestranda do Programa de Pós-Graduação do Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – PGPSA/IP/UERJ

carolinaicancela@gmail.com

HELOISA CALDAS

AME da scola Brasileira de Psicanálise e da Associação Mundial de Psicanálise – EBP/AMP. Docente do Programa de Pós-Graduação do Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – PGPSA/IP/UERJ

helocaldasr@gmail.com

RESUMO

O cenário político brasileiro tem se caracterizado pela crescente presença e influência de grupos evangélicos nas bancadas governamentais. Esse movimento não é sem efeitos, engendrando uma série de desdobramentos na moralidade dos sujeitos. Circunscrever os aspectos envolvidos nesse fenômeno e investigar o porquê de sua ascensão, especialmente em um momento de avanço das pautas de grupos minoritários e de uma maior tolerância às diversidades, é o objetivo da reflexão teórica à qual este artigo se dedica. Para tanto, os conceitos freudianos de recalque e sublimação são articulados ao feminino e seus efeitos políticos e de segregação e, assim, são tomados como chave de leitura destinada à sustentação da hipótese de que a regulação dos afetos e seu modo de operação se conformam de maneira singular na contemporaneidade, produzindo, dessa forma, ameaças ao laço social e aos valores tradicionais.

PALABRAS CHAVE: Psicanálise | Religião | Moral | Feminino | Segregação | Política

RESUMEN

El escenario político brasileño se ha caracterizado por la creciente presencia e influencia de los grupos evangélicos en el gobierno. Este movimiento no deja de tener efectos, engendrando una serie de desarrollos en la moral de los sujetos. Circunscribir los aspectos implicados en este fenómeno e investigar el porqué de su ascenso, especialmente en un momento de avance de las agendas de los grupos minoritarios y de mayor tolerancia a la diversidad, es el objetivo de la reflexión teórica a la que se dedica este artículo. Para lograrlo, los conceptos freudianos de represión y sublimación se articulan con lo femenino y sus efectos políticos y de segregación y se toman así como clave de lectura destinada a sostener la hipótesis de que la regulación de los afectos y su modo de funcionamiento se configuran de manera singular en la contemporaneidad, produciendo así amenazas al vínculo social y a los valores tradicionales.

PALABRAS CLAVE: Psicoanálisis | Religión | Moral | Femenino | Segregación | Política

ABSTRACT

The Brazilian political scene has been characterized by the growing presence and influence of evangelicals in the government and congressional bloc. This trend is not without effects, engendering a series of developments in the morality of the subjects. To circumscribe the aspects involved in this phenomenon and investigate the reasons for its rise, especially at a time of advancement of minority groups’ agendas and greater tolerance to diversity, is the objective of the theoretical reflection to which this article is dedicated. To this purpose, the Freudian concepts of repression and sublimation are articulated to the feminine and its political and segregation effects and, thus, they are taken as a reading key to support the hypothesis that the regulation of affections and its mode of operation are shaped in a unique way in contemporaneity, producing, in this way, threats to the social bond and traditional values

KEY WORDS: Psychoanalysis | Religion | Moral | Feminine | Segregation | Politics

INTRODUÇÃO

O cenário político brasileiro tem se caracterizado pela crescente presença e influência de evangélicos nas bancadas governamentais – dinâmica cujo início pode ser situado na década de 1960, com a tentativa de inserção de pastores e líderes religiosos de origem protestante no Congresso Nacional. Tal movimento não é sem efeitos, engendrando uma série de desdobramentos na moralidade dos sujeitos. Circunscrever os aspectos envolvidos nesse fenômeno e investigar o porquê de sua ascensão, especialmente em um momento de avanço das pautas de grupos minoritários e de uma maior tolerância às diversidades, é o objetivo da reflexão teórica à qual este artigo se dedica. Considerando-se que uma grande parcela dos governantes eleitos no Brasil nas últimas décadas advoga a favor do discurso religioso, como compreender as contingências dessa plataforma conservadora que se estabelece na contramão do progresso democrático.

Tomando os conceitos freudianos de recalque e sublimação como orientadores, levantamos a hipótese de que, no contemporâneo, as formas dos afetos operarem como reguladores pulsionais não são as mesmas da época de Freud. Essa mudança traz, como efeito, uma ameaça ao laço social; um afrouxamento da base que sustenta o grupo familiar e as instituições tradicionais. Hoje, com o avanço das mídias eletrônicas, os agrupamentos humanos são constituídos em redes sem uma hierarquia vertical – fator que também deve ser cotejado com as formas contemporâneas das religiões se manifestarem e alcançarem maiores números de adeptos.

Ressaltamos, assim, como principal subsídio deste trabalho, que o recrudescimento da participação evangélica na política tem se dado como resposta à ameaça que os avanços dos grupos minoritários vêm alcançando, fazendo vacilar os valores religiosos tradicionais. Isso se deve, a nosso ver, às duas décadas de lutas sociais pela legitimação das diferenças dos grupos minoritários – sociais, sexuais, raciais. Tal recrudescimento moralista pode ser constatado não apenas pelo aumento vertiginoso de evangélicos na população brasileira, como também pela multiplicação da participação de evangélicos na esfera política.

O que aconteceu para que isso se instituísse? Por que, em um momento de maior tolerância à diversidade, à liberdade de expressão e de comportamentos, antes considerados inadequados ao status quo, a sociedade brasileira elegeu como governantes pessoas claramente inseridas no discurso religioso[1]?

É importante lembrar que o Brasil é considerado um país laico desde 1890, através do decreto 119-A, de Ruy Barbosa. Se o Estado laico exige um governo sem nenhuma posição religiosa definida, podemos afirmar que o atual governo brasileiro está desafiando a neutralidade religiosa e os limites propostos por esse Estado? Quais são as consequências da gerência do Estado – quando ele deixa de ser laico – na moral sexual de um povo?

Sigmund Freud (1905 [1996]) descreveu uma moral sexual civilizada marcada pela vergonha e pelo pudor, na qual prevaleciam os mecanismos do recalque e da sublimação das pulsões sexuais, desde o desenvolvimento, da sexualidade infantil e o caráter perverso polimorfo que a determina. Freud (1929 [1996]) ressaltou que essa moral civilizada, transmitida pela educação, era atravessada pela religião que realizava uma função regulatória no circuito pulsional.

Atualmente, a sociedade apresenta uma moral sexual civilizada distinta da época freudiana. Podemos dizer, a partir do texto Nota sobre a vergonha (2002/2003), de Jacques-Alain Miller, que a vergonha e o pudor não são atualmente os afetos preponderantes quando se trata da sexualidade; e os mecanismos de recalque e de sublimação se apresentam menos operatórios do que antes. Essas modificações se expressam pela fragilização da função da autoridade, pela horizontalização das relações familiares, pelo crescimento de patologias mentais – como a depressão e a síndrome do pânico – e pelo aumento da agressividade no dia a dia das cidades –, para citarmos apenas alguns exemplos.

A modificação dos afetos e a diminuição da operatividade dos mecanismos psíquicos é consequência do fato de o Outro simbólico não ser mais o garantidor das tradições que regulavam os modos de gozo dos sujeitos (Miller, 1996-1997 [2005]). Quando a regulação dos modos de gozar não ocorre pelos modos tradicionais, uma ameaça surge no laço social. Diante desse cenário, recrudescem o retorno às tradições e às normas, tal como temos visto acontecer nos últimos anos através da ascensão da bancada evangélica no país, por exemplo.

Diante do fato de a agenda moral religiosa defendida atualmente no Brasil se assentar na negação de noções caras à democracia – tais como pluralidade, tolerância, justiça social e direitos humanos –, duas questões se colocam: quais são os efeitos do fato de o Outro simbólico não recobrir o campo de gozo singular e privado com semblantes de modos de gozar tradicionais e públicos? Quais são as ficções que operam como reguladores pulsionais no pensamento evangélico?

As pautas defendidas pelo atual governo brasileiro estão de acordo com o modelo da moral sexual descrita por Freud – a monogamia, o casamento civilizado, a sujeição sexual da mulher – e, portanto, contra as formas contemporâneas de vida. De que riscos essas pautas pretendem defender o povo brasileiro? Trata-se de uma defesa contra formas distintas de gozar que não prezam pela família e pelas tradições; tal como a discussão sobre a ideologia de gênero, a formação da família natural, a educação sexual nas escolas, a pretensão de retornar à psicopatologização da homossexualidade, o que justificaria a chamada cura gay.

Em O racismo 2.0 (2014), Éric Laurent cita uma passagem do texto Televisão (1974 [2003]) em que Lacan adverte sobre a escalada do racismo nos próximos anos, pois “não sabemos o que é o gozo a partir do qual poderíamos nos orientar. Só sabemos rejeitar o gozo do Outro” (Laurent, 2014, p.2). Com essa afirmação, Lacan ressalta o duplo movimento do colonialismo e de sua força em normalizar o gozo daquele que é deslocado; em suas palavras: “deixar esse Outro entregue a seu modo de gozo, eis o que só seria possível não lhe impondo o nosso, não o tomando como subdesenvolvido” (Laurent, 2014, p.2). O autor acrescenta que o choque entre os gozos múltiplos – e não o choque entre as civilizações – é responsável pela fragmentação do laço social e pelo apelo irresistível a um Deus unificador. Como efeito do choque entre gozos, Lacan antecipou o retorno dos fundamentalismos religiosos: “Deus recuperando a força, acabaria por ex-sistir” (Laurent, 2014, p.2).

Laurent (2014) afirma também que, na medida em que as formas sociais se modificam, o racismo também modifica seus objetos, propiciando encontrar sempre em uma comunidade humana a crença no domínio de uma barbárie através da rejeição de um gozo inassimilável. Laurent ainda demonstra que Lacan (1974) sinalizou que o nosso futuro de mercados comuns encontrará seu equilíbrio numa ampliação cada vez mais dura dos processos de segregação, provocados pelo remanejamento dos grupos sociais e da universalização que ela introduz.

Ainda em O racismo 2.0 (2014), Laurent retoma Psicologia das Massas e análise do Eu (1921 [1996]), texto no qual Freud discute o destino pulsional e o processo de identificação que rege de forma determinante o psiquismo. A comunidade dos crentes e as igrejas – tal como o exército – eram, para Freud, exemplos de grupos altamente organizados, artificiais e permanentes. Essa organização decorre do ódio contra uma pessoa ou uma instituição, que funciona para unificar seus membros. Laurent alega que o ódio e a rejeição racistas se unem em torno de um líder, que toma o lugar do pai; e conclui que o gozo maligno no discurso racista está no fundamento de todo o laço social. Nas palavras de Laurent (2014, p.5): “O crime fundador não é o assassinato do pai, mas a vontade de assassinato daquele que encarna o gozo que eu rejeito”.

O recrudescimento dessa moral também tem efeitos sobre as formas de se lidar com o feminino na contemporaneidade. No texto Feminino e Feminicídio no Brasil atual (Caldas, 2020), aborda-se o conceito do Nome-do-Pai, sua pluralização e seu declínio nas últimas décadas, assim como os seus efeitos nas diversas formas do sujeito subjetivar o gozo. É preciso ressaltar que, com o retorno do ultraconservadorismo no Brasil, foi instituído o pior do regime patriarcal, mais especificamente, a violência sexista, racista e antidemocrática. Isso permite ver que elas são efeito da resistência contra a diversidade sexual e social, do conflito entre o sistema do patriarcado e uma nova ordem que está em percurso. Produziria essa nova ordem novas formas de gozar?

A criminalidade sexista direcionada ao feminino provém não só do autor do crime, mas, também, de discursos correntes na sociedade atual que alimentam o ódio à diferença. Os crimes contra a mulher tendem a ser silenciados e naturalizados pelo sistema patriarcal machista, que considera o corpo da mulher como um objeto pertencente ao Outro. Vale ressaltar que, para a psicanálise, o feminino não se restringe à anatomia:

Feminino indica, mais do que diz, algo substancial, porém intangível pela linguagem. Trata-se, aliás, do resto da operação significante pela qual se define um saber-fazer com o gozo, recusando e tomando como alteridade ameaçadora tudo o que difere deste saber. A rigor, o feminino está presente na segregação de forma geral: sexismo, racismo, homofobia, origem social e/ou cultural, etc. (Caldas, 2020, p. 2).

Também vale retomar a referência que Miller faz ao texto freudiano Tabu da Virgindade (Freud, 1918 [1996]) para localizar, no tabu, a evitação de um gozo estranho que situa uma mulher como figura hétero – semblante de um gozo Outro que sempre comparece, de certa forma velado, nas parcerias amorosas. No entanto, o sujeito se ilude ao localizá-lo apenas no corpo alheio, pois ele é exatamente o que se encontra de mais alheio no corpo próprio.

As identificações de gênero advêm do simbólico e do imaginário como semblantes que, se aceitos e estabelecidos pela cultura, constituem posições, papéis e lugares. Portanto, homens e mulheres são apenas seres de discurso que, vinculados ao laço social subordinam-se, igualmente, ao sexuado. Tais discursos servem como manuais para cada sociedade e época, delimitando categorias segregativas e inclusivas, apesar de nenhum sujeito se adequar perfeitamente a eles. A psicanálise incide nas questões do gozo, orientadas por uma ordem simbólica que define o que é ser homem ou mulher a cada nova narrativa de uma época. Narrativas denunciadas, especialmente, pelos grupos minoritários.

A época de Freud, a era Moderna, estava sustentada pelo sistema patriarcal. Todavia, a partir da escuta de Freud da fala das histéricas, às mulheres foram concedidas possibilidades de ocupar um novo lugar de fala para expressar suas modalidades de gozo, seu desejo sexual e seus recalques ainda que sob a forma de sintoma a analisar. De todo modo, uma pergunta se colocava desde então: como conciliar amor e gozo?

Freud situou a (im)possibilidade dessa conciliação com o conceito de falo, um significante, como Lacan apontou, que organiza o que se tem e o que se perde. Para as mulheres também havia algo semelhante ao falo e ao horror de sua perda: as virgens, que podiam ser defloradas, e as mulheres ao serem destituídas e devastadas, por exemplo. Desde o século 20 esse horror foi motor para lutas pela cidadania, para o direito ao voto, ao ingresso nas universidades e nos cargos políticos, etc. Freud escutou essas mulheres e também pôde depreender uma bissexualidade constitucional responsável por produzir a pergunta fundamental do quadro de histeria: sou homem ou sou mulher?

 Para enriquecer esta discussão, citamos um trecho do livro Histeria e Sexualidade – Clínica, Estrutura e Epidemias (Coutinho Jorge & Travassos, 2021):

[…] para entender o alcance do conceito de bissexualidade para Freud é essencial para não confundir com noções básicas sobre a suposta existência difundida pelo senso comum de uma porção masculina e porção feminina. Bissexualidade tem a ver estritamente com a dupla escolha de objeto de sujeitos, estrutural porque tributária da dupla face do percurso edípico. Toda criança tem sentimentos e desejos ligadas a ambos os sexos, embora suas correntes de investimentos sexual seja em geral constituída por forças que tendem incidir mais sobre um dos polos, masculino ou feminino (Coutinho Jorge & Travassos, 2021, p.75).

Falta ao humano uma orientação natural em direção ao par sexual, uma vez que somos animados pela pulsão cujo objeto é variado. Os sujeitos se dividem pelos semblantes – que são referidos aos registros do simbólico e do imaginário – e pelo gozo, que é da ordem do real, portanto, não passa de todo pelo significante. Essa divisão é tributária, de acordo com Freud (1925), de uma operação anterior em que algo se afirma ao mesmo tempo em que resta fora e recusado. Ao restar, aquilo que foi recusado assombra e ameaça as identificações do eu. Tanto Freud como Lacan consideram que o sujeito da psicanálise é um sujeito dividido: nas teorizações freudianas, entre consciente e inconsciente; nas lacanianas, desde a inscrição do significante mestre que organiza o gozo, nãotodo, no eixo do ter ou não ter (o falo).

É no texto freudiano Análise terminável e interminável (1937 [1996]), que melhor se evidencia a problemática do feminino, no que Freud nomeou de “rochedo da castração”,  que atinge tanto os homens como as mulheres. Freud não colaborou com o machismo, mas, ao contrário, ele leu o machismo cultural de sua época, identificando a crença dominante do homem europeu e branco e sua forte recusa ao feminino em si mesmo. Com essa leitura, Freud retirou a fragilidade dos chamados homens viris do campo das verdades encobridoras sustentadas pela paixão da ignorância que quer esquecer a castração humana, sua finitude, sua perda estrutural.

Nos textos Psicologia das massas e análise do eu (1921 [1996]) e em O Mal-estar na cultura (1930 [1996]), Freud aborda o indivíduo no campo da coletividade, destacando o mal-estar proveniente da renúncia das pulsões parciais que a vida coletiva obriga. A cultura foi compreendida a partir da escuta do caso a caso, do um a um preconizado pela psicanálise.

Levando em conta a contribuição relevante da psicanálise à época atual não era de se esperar tamanha resistência contra as conquistas das minorias plurais. No entanto, o declínio do Nome-do-Pai e sua pluralização produziram um retorno ultraconservador ao pior do regime patriarcal. A resistência contra a diversidade sexual e social indica assim, uma defesa contra a emergência da força pulsional presente na luta entre a ordem patriarcal e uma nova ordem, que vem se instituindo. Nessa nova ordem, fica claro que o feminino não se reduz a um adjetivo referido às mulheres, mas aponta para algo inatingível pela linguagem, para o resto da operação significante. Trata-se de um saber fazer com o gozo e de uma recusa da alteridade que ameaça o que difere desse saber. Como citado anteriormente, o feminino está presente na segregação de forma geral, tal como na homofobia, no sexismo, no racismo. No entanto, sexismo e racismo são da mesma ordem, na medida em que homem e mulher são duas raças, efeitos de discurso que mudam conforme a época. A psicanálise constata um ataque ao feminino, que aparece, inclusive, quando o feminino é a posição sexuada de um sujeito que possui um corpo anatomicamente masculino (Caldas, 2021).

A segregação parece então ter raízes antes da linguagem organizada pelo sujeito; no campo da sexuação e letras de gozo segundo uma lógica de rejeição de um gozo inassimilável. Esse eixo nos permite pensar o ódio à diferença – tônica atual – e o recrudescimento de uma extrema direita tão virulenta quanto a que se alastra mundialmente.

Sabemos hoje que homens e mulheres podem ter ou não ter poder fálico, da mesma forma ambos podem ocupar uma posição do feminino. Se ninguém escapa ao feminino, tampouco escapa-se ao fálico. Ninguém é exclusivamente feminino, nem exclusivamente fálico. O problema que aparece entre fálico e feminino está na subordinação – por isso a posição feminina ameaça – presente em várias dicotomias, tais como: homem e mulher, razão e loucura, consciente e inconsciente, rico e pobre, hetero e homossexual, saudável e doente, jovem e velho, branco e preto, índio e escravizado. Todos esses pares tratam da subordinação e da dificuldade em fazer com o gozo e com o feminino que escapa. Segregar ou tolerar, aceitar ou matar: a dialética do gozo.

Nesse sentido, vale lembrar que o trabalho do inconsciente, como Lacan propôs, é um trabalho político: o inconsciente é a política. Um trabalho analítico que permite ao sujeito escapar das armadilhas do controle e da ameaça daquilo que é tão repudiado. Ao invés disso, possibilita que ele possa se servir desse gozo como uma fonte do feminino, um solo para as invenções, formas de violar o estabelecido da boa maneira como faz a Arte. A licença artística feminino não viola pela ameaça, nem pela defesa, mas pela criatividade, alegria, subversão e transgressão.

Assim, a ética da psicanálise passa pelo sujeito singular (Caldas (2021) e a psicanálise incide no um a um de cada caso. A articulação entre os modos de gozo que transbordam de cada cultura e as reações ultraconservadoras e violentas diante deste gozo inassimilável que atinge todos os corpos nos permite considerar a religião como uma instância fiscalizadora na cultura, que tem como objetivo refrear o gozo.

Curiosamente, há cerca de 7 anos foi publicada uma matéria no site Jusbrasil[2], na qual foram abordadas as práticas de pastores evangélicos que se utilizam da psicanálise para fazer crescer tanto o seu rebanho quanto o dízimo. Essa notícia veicula a informação sobre a existência da Folha universal, periódico da Igreja Universal que circula semanalmente há 21 anos em todo o Brasil. A Igreja Universal, fundada por Edir Macedo em 1977, é a maior entre as igrejas neopentecostais do Brasil, reunindo, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 1,8 milhões de fiéis em todo país. Essa igreja se define como neopentecostal por se afastar do pentecostalismo e por vincular a prosperidade como via de aproximação com Deus.

Grande parte das igrejas neopentecostais se pretende especializada no cuidado de três conhecidos “problemas” humanos: a saúde, o amor e o dinheiro, diz o psicanalista Wellington Zangari, doutor em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo e vice-coordenador do Laboratório de Psicologia Social da Religião do Instituto de Psicologia da USP. “Para alguns pastores, não importa se existem médicos, psicólogos e outros profissionais de saúde para lidar com questões de doença. Há sempre uma interpretação bíblica para oferecer e vender saúde”[3]. Segundo Zangari, os pastores evangélicos se utilizam de reinterpretações de inúmeros discursos da cultura, incluindo a psicanálise, incorporando-os ao discurso religioso.

Izilmar Franco, que é entrevistado na reportagem, possui dupla formação: pastor batista desde 1986 e psicanalista desde 1998. Sua formação como psicanalista se deu na Sociedade Psicanalítica Ortodoxa do Brasil (SPOB), fundada em 1966 com o intuito de se tornar a maior sociedade de psicanalistas da América Latina. Seu objetivo sempre foi de disseminar a psicanálise. Em seus 18 anos de existência, concluiu mais de cem turmas em todos os estados brasileiros e formou cerca de três mil psicanalistas. O único pré-requisito para participar dos cursos é ter um diploma de graduação, seja ele qual for. Em dois anos, depois de participar de aulas duas vezes por mês e realizar 80 sessões de análise, o aluno recebe seu diploma de psicanalista[4].

Segundo Izilmar Franco, essa busca tem como pano de fundo um aperfeiçoamento para além do campo religioso, pois a psique é uma área de grande importância para se obter autoconhecimento e o conhecimento do outro. Izilmar afirma que “não podemos negar o conhecimento ou os benefícios que a psicanálise trouxe para nós, desmistificando muitas coisas. Também de forma alguma podemos negar a fé e principalmente a fé em Jesus Cristo”[5].

Nessa mesma matéria, Gildásio dos Reis, pastor da Igreja Presbiteriana do Parque São Domingos e docente no centro de Educação, Filosofia e Teologia (CEFT) da Universidade Presbiteriana Mackenzie, alega que psicanálise e teologia partem de pressupostos conceituais bastante diferentes. Para ele, essa incompatibilidade permeia o campo da ética. Nas palavras de Gildásio: “Quando eu clinicava, há dez anos, deixava claro aos pacientes sobre minha fé e dizia que, no tratamento, iria fazer uso da teologia para ajudá-los”. Quando ele se deparava com temas considerados pecado, como, por exemplo, o adultério, a homossexualidade e o aborto, ele se orientava através dos princípios bíblicos para dar direção aos seus casos clínicos.

Visando enriquecer a discussão, a reportagem também consultou Sérgio Laia, AME – Analista Membro da Escola Brasileira de Psicanálise – e professor de Psicologia da FUMEC, em Belo Horizonte. Segundo Sérgio, existe uma questão conceitual relevante quando se trata da associação da teologia com a psicanálise. Nas suas palavras: “A perspectiva de Freud era a de que a religião está para a civilização assim como a neurose está para o indivíduo. É dessa forma que a psicanálise lida com a religião – e uma pessoa que pratica uma atividade religiosa dificilmente aceitaria esse tipo de definição”.

No entanto, Izilmar não compartilha das ideias contrárias à associação das suas práticas, já que ambas trabalham com a verdade. Essa ideia foi veiculada por Heitor Antonio da Silva, um dos fundadores da SPOB. Segundo Silva:

Não existe incompatibilidade alguma entre psicanálise e religião, pois se a psicanálise é uma verdade, ela tem que ser compatível com qualquer ciência. Se a religião é verdadeira, ela também terá que ser compatível com qualquer ciência […] se duas coisas se apresentam incompatíveis, ou ambas são mentirosas ou uma delas o é[6].

Um destaque também foi dado ao protagonismo do deputado e pastor evangélico Éber Silva que, em 2000, liderou o projeto de lei no Congresso Nacional que tinha como meta regulamentar o exercício da psicanálise no Brasil. O projeto foi apoiado pela SPOB e teve como efeito a potencialização dos conflitos já existentes com a comunidade psicanalítica. Nesse conflito de forças, Heitor da Silva alegou que “a SPOB não oferece cursos para pastores, mas para qualquer pessoa que tenha formação universitária. Nunca foi uma sociedade religiosa ou vinculada à religião”. Ele admite, no entanto, que a sociedade forma muitos pastores e líderes religiosos, pois estes exercem funções que lidam com a ‘problemática humana’”.

Além da SPOB, a Faculdade Gospel, instituição ativa há vinte e cinco anos, também foi contemplada com o seguinte currículo: “junto às aulas de aperfeiçoamento em bibliologia, direito eclesiástico, história de Israel, liderança cristã e outros cento e cinquenta títulos, há também os cursos de ‘psicanálise clínica pastoral’ e ‘psicanálise cristã’”.

Como contraponto, a matéria entrevistou Doryedson Cintra, professor de psicanálise da SCOPSI (Sociedade Contemporânea de Psicanálise), que qualifica como psicanálise selvagem a prática clínica realizada por pastores evangélicos, uma vez que, além de identificar uma espécie de chantagem terapêutica na qual o paciente ocupa sempre um lugar passivo, há também um erro diagnóstico, como no caso de uma histeria ser classificada como possessão.

O fechamento da reportagem traz, na voz de Wellington Zangari, um ponto de basta entre a religião e a psicanálise:

Cada uma dessas perspectivas oferece compreensões do ser humano baseadas em modos de obter conhecimento que são, por vezes, antagônicas. A religião supõe a existência de agentes espirituais intencionais e uma ordenação da realidade que é ligada àqueles agentes. A ciência, por outro lado, não enxerga a realidade a partir de referenciais sobrenaturais[7].

Tomando como base o artigo de Jacques Lacan (2005), O Triunfo da Religião, Gabriel Binkowski, em uma reportagem extraída da revista Lacuna, discute a incompatibilidade entre religião e ciência: enquanto a psicanálise trabalha com o mal-estar proveniente da civilização, a religião “é uma máquina de produzir sentido” (Binkowski, 2019, p.1). Essa diferença tem, como consequência, éticas diferenciadas para cada uma das práticas. Enquanto a religião visa a uma cura, a psicanálise “se ocupa do falasser (parlêtre), desse animal falante que é o homem, em como ele fabrica essas atividades com a palavra e de como isso está ligado às coisas que Freud tomou como sendo as da sexualidade” (Binkowski, 2019, p.1). Mais um ponto de divergência identificado por Binkowski tem o mesmo ponto de partida: a falta. No entanto, enquanto a religião visa a preencher essa falta anulando a perda do objeto via consolação, a psicanálise trabalha a realidade do desamparo fundamental.

O autor dessa matéria, alinhado às ideias trazidas pela primeira reportagem aqui supracitada, denuncia o fenômeno recente de grupos evangélicos que fazem uso da psicanálise. Ele não deixa de fora o surgimento de projetos de lei que visam à regulamentação da profissão de psicanalista e o questionamento sobre as orientações de gênero e de desejo sexual defendidas pela própria psicanálise. Na elaboração desses projetos de lei, segundo Binkowski, é possível identificar ideias psicanalíticas adaptadas à ideologia religiosa.

Mais uma vez, o projeto do pastor e deputado federal Éber Silva (PDT – RJ) foi mencionado:

Foi o pastor evangélico e deputado federal Eber Silva (PDT-RJ) quem, em 13/12/2000, apresenta na Câmara o projeto de lei nº 3.944, que trata da regulamentação da profissão de psicanalista. Nesse projeto, o exercício profissional da psicanálise deveria ser pautado por um estatuto único, cabendo ao MEC definir um currículo mínimo, estágios, a questão da análise didática etc., ficando os Conselhos Federal e Estaduais de Medicina responsáveis por fiscalizar essas entidades de ensino. Havia a prerrogativa de que as sociedades psicanalíticas pré-existentes a essa legislação ficariam de antemão reconhecidas. O que mudaria seriam os critérios para a criação de novas entidades de formação. O projeto sofreu grande rejeição por diferentes grupos de psicanalistas e acabou arquivado. Ademais, era sabido que o grande sustento do projeto vinha da SPOB, a Sociedade Brasileira de Psicanálise Ortodoxa[8].

Apesar do arquivamento desse projeto, dois anos depois, em 2003, outro deputado e pastor da Assembleia de Deus, Édino Fonseca (PRONA), apresentou na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro um novo projeto:

Fortemente apoiado por grupos pastorais como o Movimento pela Sexualidade Sadia (Moses) e o Corpo de Psicólogos e Psiquiatras Cristãos (CPPC), o projeto de lei propunha ‘criar no âmbito do Estado do Rio de Janeiro o programa de auxílio às pessoas que voluntariamente optarem por mudança de homossexualidade’. Aprovado pelas Comissões de Constituição e Justiça, a de Saúde e a de Combate às Discriminações e Preconceitos de Cor, Raça, Etnia, Religião e Procedência Nacional, o projeto acabou sendo barrado apenas pela Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania[9].

Ainda na mesma matéria, Gabriel traz mais uma contribuição de suma importância. Ele retira de uma entrevista de Heitor da Silva (fundador da SPOB) concedida à revista Piauí seu discurso a respeito da homossexualidade. Heitor afirma não ser preconceituoso “porque se trata de uma patologia […] ela não é uma coisa boa. É uma agressividade, consciente ou inconsciente. É prejudicial para a pessoa, mas eu não bato, não hostilizo, não xingo. Trato como outro problema qualquer, como pedofilia ou necrofilia”.

Gabriel considera a possibilidade de que um sujeito analisado acabe por se tornar um ateu. Contudo, mais uma vez fazendo valer as ideias lacanianas de que todo homem creeria secretamente em Deus, ele acredita que seja impossível o sujeito se desprender totalmente do Outro por vezes atrelado a uma representação de divindade. Sendo assim, o sujeito analisado não se torna um ateu por completo: não renuncia ao Outro, mas não crê mais nas garantias divinas.

O repórter analisa dois movimentos evangélicos: o pentecostal – que se baseia em uma vida mais distante da modernidade, orienta seus fiéis a prescindirem dos apelos midiáticos e das formações culturais, consideradas práticas do mal que não garantem uma vida eterna de purificação após Juízo Final – e o movimento neopentecostal – que se direciona a um sentido contrário, utilizando-se da mídia para se propagar e se engajar na transformação da política do mundo e no combate do mal. Na intervenção dos neopentecostais sobre o mundo dos homens, a psicanálise passou a ser utilizada como uma arma teológica, espiritual e moral para alcançar uma camada da população não elitista a qual a psicanálise não penetrara.

Sabemos que grande parte dos evangélicos pertence a camadas mais populares, que vivem em meio a dificuldades econômicas, em zonas urbanas deixadas a esmo pelo poder público, submetidos às piores mazelas do racismo, do preconceito, da indiferença social e até da violência direta das forças da ordem. No entanto, os articuladores desse movimento evangélico pertencem, normalmente, às camadas sociais mais favorecidas e que acabam, em seu proselitismo-militante, nessa Guerra Santa, amealhando os lucros e louros para si, num projeto de poder desenfreado. Parece-nos, e aí entramos na zona das hipóteses ainda iniciais, que a psicanálise entra como fundamento de discurso e arcabouço técnico, como um discurso disciplinar, moralizante e bastante efetivo para lidar com o sofrimento subjetivo dessa população mais sofrida. A “psicanálise” vira um nome da máquina de guerra da conquista de território, das almas, da população. Temos algo como o uso da energia nuclear para fazer bombas, ou seja, um desvio técnico que se aproveita de algo muito potente[10].

Por fim, Binkowski faz alusão à afirmação freudiana de que “o verdadeiro investigador não se encontra ao abrigo do desamparo, diferentemente do investigador que está garantido pela tradição do conhecimento de origem religiosa, o qual assim seria um fabricante de imposturas”[11]. É evidente que precisamos lutar para que a profecia de Lacan não chegue mais rápido do que deveria, afinal, isso só adiantaria a chegada de um mundo em que a subjetividade seria muito menos complexa.

Para concluir podemos nos valer das considerações de Jacques-Alain Miller em Intuições Milanesas (2011) sobre a relação entre inconsciente e política. De partida, ele ressalta a proposição de Lacan encontrada no seminário A lógica da fantasia (1966-1967, p.2): “não digo, ‘a política é o inconsciente’, mas simplesmente ‘o inconsciente é a política’”.

Miller questiona se os psicanalistas estão na cidade e afirma que essa questão ainda é discutível apesar de a psicanálise estar na política. Para desenvolvê-la, ressalta oito reflexões que nomeia de intuições: na primeira, equipara as formações coletivas às formações do inconsciente; cita Freud em Psicologia das massas (1921 [1996]) para evidenciar o significante identificatório e a mesma causa de desejo entre os sujeitos da massa. Em vista disso, conclui que a política se reduz ao inconsciente. No entanto, Miller alerta que podemos rejeitar a tese de que a política se reduz ao inconsciente, assegurando que não é propriamente da política que Freud fala, mas sempre do inconsciente; afinal, os termos identificação, censura, recalque do gozo, são abordados por Freud no regime paterno. Sendo assim, podemos encontrar um campo estruturado pela instância do pai.

Em sua segunda reflexão, Miller faz indagações sobre a definição da política e cita o filósofo Marcel Gauchet (2009, p.4) em seu livro A democracia contra ela mesma: “É nisto que consiste especificamente a política: ela é o lugar de uma fratura da verdade”. A leitura que Miller faz sobre essa definição é que o politólogo localiza que na dor o sujeito experencia que a verdade é dividida. Miller conclui essa reflexão asseverando que “o inconsciente é a política” (Miller, 1966-1967, p.6), o que é o mesmo que dizer que o inconsciente é o discurso do Outro.

Na terceira intuição, o autor esclarece por que o sujeito do inconsciente está referido a um Outro e discute o caráter transindividual do inconsciente. Para Miller, a transindividualidade do inconsciente é o que permite entender que o inconsciente é político. No entanto, ele adverte que esse Outro nunca será Um e sim dividido. A intenção do autor é sublinhar que a qualidade política que ele atribui ao inconsciente o retira de uma visão reducionista, lançando-o em um âmbito amplo da cidade.

Contudo, em sua quarta reflexão, ele questiona o atributo real que pode ser delegado à cidade homogênea, pois, a seu ver, ela se encontra no registro do imaginário. Além dela, o Estado-nação também se encontra desestruturado, questionado, frágil e, por vezes, pulverizado. Os psicanalistas precisam considerar o quanto a “globalização” é responsável pela desestabilização do espaço social, das perdas de referências, pois ela tem como efeito a suspensão da noção de lugar e da própria categoria de falta.

Seguindo os passos de Miller, na quinta intuição ele utiliza a leitura lacaniana a respeito do espaço social do qual emergiu a psicanálise para a época Pós-moderna. A sua análise considera que teria havido uma passagem de um Outro disciplinar e interditor – o qual modulava e censurava a sexualidade – para um campo social onde o Outro não existe.

Na sexta intuição, Miller evidencia que, na releitura que Lacan realiza da obra freudiana, pode ser identificada a atualização de 3 fases: 1) Lacan formalizou os conceitos freudianos de inconsciente através do sintagma “o inconsciente é estruturado como uma linguagem”; articulou os conceitos de Édipo, castração e recalcamento à metáfora paterna (Nome-do-Pai) e atribuiu um caráter metonímico e de desejo à libido; 2) Lacan fez uma passagem do classicismo ao subversivo. O Nome-do-Pai foi pluralizado afetando a operação do recalque que traz a reboque um deslizamento do desejo interditado para uma priorização da noção de gozo. Esse deslizamento se desdobrou na noção de falta e o que vinha supri-la. Nessa fase Lacan deu um salto para além da obra freudiana e formalizou o conceito de objeto a; 3) Lacan elegeu o gozo como conceito essencial que veio desbancar o protagonismo do recalque. Enquanto o mecanismo do recalque encontrava-se em oposição ao prazer, produzindo um desejo interditado, o gozo não tem contrário, pois está articulado ao registro do pulsional – que não tem barra. Para Miller, essa nova visão corresponde à saída de uma época disciplinar para uma época de arranjos e regimes de gozo.

Na sétima intuição, Miller discorre sobre o final da análise. Para ele, a análise é um percurso desses regimes de gozo. A premissa lacaniana de que a relação sexual não existe é o testemunho fidedigno da abolição das referências da época disciplinar. Conclui, assim, que a globalização produz a era do gozo, onde o que fica aberto é o espaço da invenção sexual.

Na oitava intuição, Miller reflete a respeito do lugar do analista nos dias de hoje. Por um lado, ele identifica que é uma classe em constante crescimento, mas, por outro lado, sofre de uma certa desqualificação já que inúmeras propostas terapêuticas de cuidado estão oferecidas no mercado.

Concluímos a partir das oito intuições de Jacques-Alain Miller que há muito a sustentar do desejo de analista na prática e no ensino da psicanálise, aspectos fundamentais para a formação dos analistas e a sobrevivência da Psicanálise.


[1] Nos baseamos no aumento do poder da bancada evangélica no Congresso e no fato de o último prefeito da cidade do Rio de Janeiro e o Presidente do Brasil eleito em 2017 serem evangélicos.

[2] https://pragmatismo.jusbrasil.com.br/noticias/140080905/pastores-cativam-fieis-evangelicos-com-psicanalise

[3] https://pragmatismo.jusbrasil.com.br/noticias/140080905/pastores-cativam-fieis-evangelicos-com-psicanalise

[4] https://pragmatismo.jusbrasil.com.br/noticias/140080905/pastores-cativam-fieis-evangelicos-com-psicanalise

[5]https://pragmatismo.jusbrasil.com.br/noticias/140080905/pastores-cativam-fieis-evangelicos-com-psicanalise

[6] https://pragmatismo.jusbrasil.com.br/noticias/140080905/pastores-cativam-fieis-evangelicos-com-psicanalise

[7] https://pragmatismo.jusbrasil.com.br/noticias/140080905/pastores-cativam-fieis-evangelicos-com-psicanalise

[8] https://revistalacuna.com/2019/12/08/n-8-05/

[9] https://revistalacuna.com/2019/12/08/n-8-05/

[10] https://revistalacuna.com/2019/12/08/n-8-05/

[11] https://revistalacuna.com/2019/12/08/n-8-05/

REFERENCIAS

  • Freud, S. (1908 [1996]) “Moral sexual civilizada e doença nervosa moderna” em Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, vol. IX. Rio de Janeiro: Imago Editora.

  • Freud, S. (1918 [1996]) “O tabu da virgindade (Contribuições à psicologia do amor III)” em Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, vol. XI. Rio de Janeiro: Imago Editora.

  • Freud, S. (1921 [1996]) “Psicologia de grupo e análise do ego” em Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, vol. XVIII. Rio de Janeiro: Imago Editora.

  • Freud, S. (1930[1996]) “O mal-estar na civilização” em Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, vol. XXI. Rio de Janeiro: Imago Editora.

  • Freud, S. (1937 [1996]) “Análise terminável e interminável” em Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, vol.  Rio de Janeiro: Imago Editora.

  • Lacan, J. (1960 [2005]) “O triunfo da religião” em O triunfo da religião, precedido de, discurso aos católicos. Rio de Janeiro: Zahar.

  • Guillen, F. (2009). Se7e Montes. Belo Horizonte: Se7e Montes Editora.

  • Macedo, E. Plano de poder. Belo Horizonte: Se7e Montes Editora.

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  • Miller, J.-A. (2002 [2003]) “Nota sobre a vergonha” em Opção Lacaniana – Revista Brasileira Internacional de Psicanálise, nº 38. São Paulo: Edições Eolia.

  • Miller, J-A. (2011) “Intuições milanesas I e II ” em Opção Lacaniana online nova série, nº 5/6. São Paulo. Disponíveis em: http://opcaolacaniana.com.br/nranterior/numero5/texto1.html e http://opcaolacaniana.com.br/nranterior/numero6/texto1.html

  • Laurent, E. (2014). “Racismo 2.0”. Disponível em: http://ampblog2006.blogspot.com/2014/02/lacan-cotidiano-n-371-portugues.html.

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